terça-feira, 19 de agosto de 2008

FICÇÃO, LEITURA E IDENTIDADE



26 a 29 de agosto de 2008

CONVITE

Nos dias 26, 27, 28 e 29 de agosto do corrente ano, a FURB, em parceria com a Fundação Fritz Müller, realizará o 1º Encontro de Leitura e Arte de Santa Catarina e o 3º Fórum Brasileiro de Literatura de Blumenau. O evento ocorrerá nas dependências da Fundação Cultural de Blumenau e na FURB, conforme cronograma abaixo.
Convidamos você a participar do evento e divulgá-lo amplamente.
É uma oportunidade para incentivar a formação de leitores críticos e apreciadores de literatura, artes visuais, música e teatro.

Programação

1o. Encontro de Leitura e Arte de Santa Catarina e

3o. Fórum Brasileiro de Literatura de Blumenau

18:30 – FCBLU

26/08/08 – Abertura

Palestra: Blumenau – Ficção, paixão, identidade.

Dr. Godofredo de Oliveira Neto

27/08/08

Palestra: As malasartes do diabo na literatura ocidental

Dra. Salma Ferraz

Noite de autógrafos

28/08/08 - Mesa redonda:

Poesia blumenauense – de onde viemos, para onde vamos

Marcelo Labes, Dr. José Endoença Martins, Ms. Marcelo Steil, Mauro Galvão

Noite de autógrafos

14:00 – FCBLU

29/08/08 – Abertura da exposição “Ler é pra cima”

19:00 – Auditório Bloco T – FURB

29/08/08 – Palestra:

Moving Beyond Plateau – from Intermediate to Advanced Levels in Language Learning

Daniela A. Meyer

Inscrições: www.ffmblu.com.br ---- Informações: cce@furb.br - (47) 3321 0251
Coordenadoras: Maria José Ribeiro, Marilene de Lima Körting Schramm.

Deu pra ver ali a mesa-redonda? Pois bem, ela acontece justamente como complemento (ou contrapartida) do Projeto Falações. Antes de apresentar os integrantes da mesa, é necessário um agradecimento especial às professoras coordenadoras do evento, Tuca Ribeiro e Marilene Schramm, que adotaram a idéia da mesa-redonda, proveniente do projeto Falações, como parte integrante e necessária para o debate em torno da literatura.

Pois bem, participarão da mesa, portanto, quatro escritores de Blumenau que têm em comum publicações em poesia. No entanto, é preciso fazer a justa ressalva de que este colóquio inicial sente falta de algumas pessoas; mas pode ser o ponto inicial para uma série de conversas a respeito da produção literária a partir de Blumenau.

Dos participantes:

Foram convidados a integrar a mesa pessoas que podem ser consideradas peças-chave da poesia em Blumenau. A começar, portanto, a apresentação destes debatedores, elucido seus contatos com a cronologia da literatura blumenauense, para ficar claro.

Marcelo Steil, além da conhecida e respeitada produção poética na década de 1990 (de quando datam alguns das mais importantes obras literárias desta região), Steil também pôs-se a pesquisar a literatura em língua alemã escrita no Brasil no século XIX. Ao lado de Valburga Huber, Steil é um dos pesquisadores que com maior segurança pode falar a respeito deste fenômeno imigrante que foram a produção poética e o silenciamente ocasionado pelos ideais do Estado Novo, de Vargas.

José Endoença Martins é poeta, escritor e dramaturgo. Não bastasse, é o grande teórico da produção literária em Blumenau. Emprestando conceitos como Deutschtum e Brasilianertum, Saudade e Esperança, de Huber e Steil, Endoença questiona a Blumenalva e a Nauemblu, correntes teórico-literárias opostas e dependentes uma da outra. Figura, hoje, como um dos maiores poetas de Santa Catarina.

Mauro Galvão, ao lado de Steil e Endoença, integrou o grupo de poetas experimentalistas da década de 1990. Tendo publicado seu último livro em 2002, tem muito a compartilhar a respeito de poesia. Com uma escrita seca e de alta informatividade, Galvão encontra-se dentre os escritores pós-modernos catarinenses; embora respeitado pela crítica, ainda merece aprofundamentos em sua literatura.

Marcelo Labes é este que vos escreve. Com uma participação quase-ativa na internet, publicou seu primeiro livro neste ano de 2008. Otimista, acredita que ainda há muito que se ler em Santa Catarina. Isso porque leitura quase sempre acaba em escrita. E escrita sobre a leitura, que é o que se faz aqui, é uma das melhores maneiras de se aprimorar a escrita da crítica e dos respectivos escritores. Por isso, enquanto não se decepciona, procura construir debates sóbrios a respeito da produção literária catarinense.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Poesia Twist, por Rodrigo Oliveira

A verdadeira surpresa surge quando alguém que escreve passa a comentar a escrita do outro. Leitores atentos, os há em cada canto, claro! Mas Rodrigo Oliveira foi além de um leitor atento e escreveu o texto a seguir sobre Falações:

Poesia Twist. Poesia com um toque de limão.

Quando eu era bem mais novo, havia um limoeiro em minha casa. Pequeninho, mas dava uns limõezinhos. E lá ia eu, catava um limão e, não muito esperto, chupava. Era azedo. Não tinha jeito de chupar aquilo sem fazer careta. E se tinha um corte ou uma afta na boca, pior ainda. Aquilo ardia como os diabos. E o pior é que depois de tudo isso, não tinha como não repetir o processo. E eu ficava ali. Chupava o limão azedo, fazia careta, ardia, mas continuava. Excluindo-se a possibilidade de eu ter sido uma criança não muito esperta ou possíveis tendências masoquistas, é mais ou menos isso que aconteceu quando comecei a folhear Falações, livro de poemas de Marcelo Labes.

Não foi fácil ler Falações sem fazer careta. Labes destila um suco ácido e, com freqüência, azedo. E eu cá com minhas aftas e cortes, volta e meia senti arder os versos do autor. Falações se divide em quatro momentos distintos. Altenatintas abre com o solitário Até Quando e já pincela os primeiros elementos melancólicos que vêm se repetir mais tarde, e lembra, com uma escada 'reta em caracol', que “não se pode voltar atrás / quando se diz que ama”. Fiação e Tecelagem traz a acidez na leitura da vida operária “de 8 horas trabalhadas / e 16 de aflição” que termina com “casa na praia encostada / carro do ano passado / e plena realização: / artrite artrose bursite / aposentadoria e caixão”. É seguido pelo azedo Manhã, difícil de engolir como a constatação “Por que não respondes? / Meu Deus, / estás fria!”. No capítulo se destaca ainda O Barco, que atenta em letras garrafais “NUMA CIDADE VITRINE / FORA DE TOM É PECADO”, num retrato de um barco que “porque não navega / não pode ser afundado”. Este poema, ao lado de Fiação e Tecelagem, torna difícil sair de manhã e não rever suas linhas na nas ruas da cidade. Mas ainda assim, tudo parece passar voando, quase despercebido pela maioria. Como descobre Passarinho com seu final seco e despreocupado “Que foi isso? / e virou-se para o lado. / Passarinho na janela, / disse ela”. Assim fica mais fácil concordar com o narrador em Bi-bap-dera-nudara, que pede: “Acende, Maria, o pavio / e deixa a vida explodir”. O capítulo encerra escarrando suas verdades, tentando aparentemente expeli-las, livrar-se delas com Expectorante, que tenta com força “Cuspir fora saudade, lembranças. / Cuspir fora saudade, tristeza. / Cuspir e ver escorregar. / Verde”.

Em Reflexscintos destaco o lírico Canção que parece, junto com Sapiência Cartesia uma tentativa do autor, não em definir-se, mas em encontrar-se. Chamou-me a atenção o fato de que, nos dois poemas, o poeta o é, através dos outros, nunca de si mesmo. Em Canção “Eu me chamo aquilo que dizes”, “Eu me chamo o nome que vais dizer”, “Eu chamo / a tua alegria / ao repetires o som / do meu nome” e em Sapiência Cartesiana “E os que me querem saber / acabam me sendo. / Sou todos os que me sabem eu”. O poeta, procurando encontrar-se, perde-se (ou finalmente encontra-se) no leitor. O autor deixa-se arrebatar novamente pela estética crua, curta e grossa no impactante In Vitro que encerra o beijo com trinta e dois dentes quebrados. A saudade também deixa sua acidez em Ontem e Simplificante, uma saudade que arde como limão em boca machucada.

Febres traz uma série de dez poemas. O capítulo tem, evidentemente, certa unidade semântica e mesmo estética, mas esta é solta, flertando com o non sense, os poemas bastante independentes. Dentre as febres de Labes, chamo atenção para Febre#07 onde o tornar-se adulto é chato mas sem remédio, Febre#08 com o poeta em busca do grande poema, mas termina entregando-se “escreveria o grande poema / se soubesse por que”. O ótimo Febre#10 retorna com toda a acidez e inunda nossas chagas com o ardor da constatação: “Caíram-me os pêlos, / a origem insiste. / Bicho”. Febre#12 retoma o ataque ao “Produto financiado / por bandas de rock inglês / e poetas franceses / que não compreendes”.

Por fim, intransiGENTES, encerra os capítulos num apanhado da obra. para paula (assim, em minúsculo mesmo) brinca com as palavras “plantandolorosamente um canto”. O Filósofoso “Tentou viver de idéias / e morreu de fome” e acabou por “pôr para fora as verdades / que só a ele pertenciam, e mais ninguém”. Em Iminência percebe-se “Que não valia a pena / viver sob certas iminências” e nos afogamos junto com os personagens. Mas em Findados o narrador ensina: “Vós, que morrestes, o mundo, / o mundo é sempre dos vivos”. E retoma com Cíclico sobre aqueles que se deixaram afogar: “(e há uma semana enterrado, / o que terá pensado / quando o primeiro verme matutino / veio lhe perfurar a coxa)”. Ainda assim Fatalidade parece lembrar que esse mesmo afogamento é inevitável: “Causa mortis: afogamento: não parava de chorar.” Retomando estas constatações Ratos encerra rápido, dinâmico (quase musical) e ainda ácido um apanhado de verdades roídas e a presciência “Vai ter pesadelo, filhinho / e acordar com a cara inchada”.

A obra conta ainda com um ensaio de José Endoença Martins, localizando Labes dentre os poetas blumenauenses. Vale a pena ler até para descobrir novos nomes da poesia de Blumenau.

Ao espremer Falações, o leitor deve também se deparar com o mesmo sumo ácido que me chamou a atenção. E cuidado: se você também tiver algumas fissuras, a leitura pode lhe arder à boca. Se há algo de doce em Falações — e há, sem dúvida — serve para aumentar o contraste com a acidez da obra. Mas se você for como eu, vai perceber que não é tão fácil largar Falações, mesmo fazendo careta. Talvez a resposta não esteja impressa no livro, mas uma pista descobri na página de rosto. Adquiri o livro do próprio autor, no lançamento, com o devido autógrafo e dedicatória. Como de costume, só li a dedicatória em casa, quando fui dar as primeiras folheadas no livro, no dia seguinte. E lá estava, na caligrafia de Labes: “Eu insisto: há que se escrever, há que se escrever mais. Vamos, então, adiante”. Talvez seja isso. Ainda que tenhamos o azedume e a acidez dos limões, é preciso escrever. É preciso ler. Afinal, como dizem por aí, se a vida nos dá a acidez dos limões, façamos, pois, limonada. Ou poesia.


Como não me canso de falar, a grande proposta deste blog ou do projeto que deu origem ao livro é a discussão sobre literatura. Que a discussão nos fortaleça, então!