quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A TARIFA AUMENTA (e quem lucra com isso?)

Eu sou de esquerda. Sou mesmo! Partindo do princípio latino de que a direita é quem governa a favor de quem pode e de que a esquerda é a favor de quem sempre pôde menos, eu lhes digo: sou de esquerda! Acontece que, alienígena, não pertenço a partido nenhum. Porque, claro, o PT sempre quererá a esquerda do PDT, e este as esquerdas do PSTU e PSOL.

Mas eu sou de esquerda e participei dos dois primeiros protestos contra o aumento da tarifa da passagem de ônibus aqui na província de Blumenau. Por que participei? Ora! Porque não tenho carro nem CNH nem nada parecido e sou usuário convicto do sistema público de transportes. E, como poucos, me senti onerado pelo aumento da tarifa e pelo não-aumento da qualidade do serviço público municipal de transportes.

Aconteceu o seguinte: partidários de ditas esquerdas perceberam num filão interessantíssimo (adolescentes estudantes), um rico mercado eleitoreiro e partiram de princípios ancestrais, tais como a reação estudantil da UNE nos anos de 1960 e 1970, para inflamar estudantes secundaristas contemporâneos a marcharem contra o aumento da tarifa e a gritar contra o prefeito e seu partido.

Não se enganem!

Sou de esquerda e acho o governo de JPK errante. No entanto, como não sou partidário, me ative a detalhes durante as duas primeiras passeatas:

1º. Quem pagou os carros de som?

2º. Quem eram os que entoavam os hinos contra a tarifa?

3º. Por que não houve uma tentativa de aproximação do público reclamante com os usuários “de fato” do transporte coletivo — ou seja: o povo?

Porque, realmente, um hino tal qual “o dinheiro do meu pai não é capim / eu pulo a catraca sim” me parece demasiadamente pueril, infantil até, porque a gurizada McDonalds não deve muito se importar com a grana dos velhos. Se se importassem, pediriam para estudar [e lutariam para que pudessem ter o direito de ensino de qualidade] numa escola pública. Mas não! Cheiram a Häagen-Dazs e reclamam da ida e volta da escola. Não, não faz sentido.

A isso me ative depois das primeiras passeatas e depois de perceber que por mais idealistas que fôssemos, pouca coisa faríamos. Ainda que muitos, ainda que muitíssimos, pouco se realizaria. E agora vejo, definitivamente, que pouco se realizará. Porque, afinal, a grana do pai do estudante que paga meia passagem para ir à escola e ao shopping tanto faz; não se dialoga com o trabalhador, de quem 6% do salário são descontados mês a mês. Não se dialoga com a classe trabalhadora do transporte coletivo (os que de fato param a cidade) para que haja simetria nos protestos. Não se dialoga com ninguém! É a juventude esquerdista partidária de aqui e de ali lutando por um lugar ao sol no mundo poliltiqueiro de sempre.

Alguma dúvida? Tenho várias: para além dos carros de som (pagos por quem?), resta o seguinte: porque dividiam-se entre ‘os da frente’ e ‘os de trás’? Eu mesmo presenciei vaia do povo de trás a hinos do povo da frente. Por quê?

Os que apoiaram, e eu estava entre eles, pergunto: quantos estavam realmente indignados com o valor abusivo e quantos estavam nas passeatas pelo calor da hora?

Mas vou resumir o final da questão: hoje à noite, no terminal de pré-embarque da Catedral, percebi que as três portas estavam abertas e que o ar-condicionado estava ligado. Mas como eu suava em bicas, achei interessante registrar o fato com minha câmera. Porque, no fim das contas, os reajustes de passagem se devem às ditas melhorias no transporte coletivo. No momento em que comecei a fotografar, fui abordado por um funcionário do SIGA que me disse que eu “NÃO PODIA FILMAR” ali dentro. E o mesmo pôs a mão na frente da lente, feroz, dizendo que eram ordens da concessionária. Respondi dizendo que eu mesmo era funcionário público, alocado no SETERB, e que era usuário pagante do transporte coletivo, ao contrário dele, funcionário privado, que tinha privilégios no momento de embarcar num ônibus. Ele insistiu e eu disse então que chamasse a polícia, ao que o mesmo respondeu de imediato, retirando o celular do bolso e discando 190. Redargüi explicando que leis federais (como a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 [artigos 48 e 79] e a Constituição Federal sobrepunham-se às diretrizes da empresa. O funcionário guardou o celular (com o qual ia chamar a polícia) e me repetiu que não filmasse. Disse então que agora que tinha explicado que estava protegido por lei, filmaria e fotografaria, e ele que me impedisse. Para tanto, sabendo ser ele assalariado, fiz questão de mão focar-lhe o rosto.

As questões finais a que chego são:

a) Num ano eleitoral, quem faz protesto contra a situação é quem merece voto?

b) “Quem boca vai a Roma” ou “quem tem boca vaia Roma”?

c) Em vez de parar o trânsito impedindo veículos de emergência de circular, ainda mais numa cidade de três ruas, por que não fazem igual a mim e enfrentam, pessoalmente e sozinhos, a miséria imposta pelas empresas concessionárias?

Daí fica a pergunta: cadê as imagens? Elas estão na minha câmera, uma Sony HX-1, cujo cano está temporariamente perdido. Peço ajuda para transportá-las pra um computador e mostrar, definitivamente, que não se trata de mera ladainha.

E peço aos que puderem filmar e fotografar a precariedade do transporte público, que o façam.

E digo ainda que não sou contra as manifestações: sou contra o oportunismo escroto-partidário!

E sigo reclamando. Não por direito, mas por dever.

Abraços!

Um comentário:

Rodrigo Oliveira disse...

Bom ver o Falações de volta à ativa, ainda que os os motivos não sejam os mais agradáveis. Não, deixe que me corrija: especialmente pelos motivos não serem tão agradáveis. Bom ver uma voz que grita, mas que aproveite o silêncio pra refletir. Porque me parece que às vezes, por trás das máscaras de Guy Falkes, há alguém disposto à atear fogo no rastilho, mas não a abraçar-se ao barril. É bom saber que lá no meio tem alguém que não deixará os destroços até ter certeza de que não voltarão ao mesmo lugar. Remember, remember... so we shall.